domingo, fevereiro 26, 2006 

Hoje estou melhor mas a coragem para escrever tem faltado, também porque sinto tristeza perante o rol de desgraças que se agitam entre nós.
Estive algum tempo sem consultar notícias e espanto meu parece que cresceram as surpresas pouco agradáveis em Portugal. O que leio, observo e vejo agudizar-se neste País assusta pelas proporções que pode tomar, não me refiro ao défice orçamental, mas às relações humanas.
Quero acreditar que melhores tempos virão, no optimismo, que o mundo é feito de mudança e de confiança. Mas que futuro será o deste País (e, consequentemente, o nosso) quando seres bem pensantes, perante a fragilidade e os direitos humanos de outros seres, apenas demonstram violência, xenofobia, homofobia, desajustamento, falta de civismo e repetem comportamentos inaceitáveis que vão até ao extremo de provocar a morte da Gisberta no Porto, porque sim... porque agiram impulsivamente... porque não pensam?
Esta morte poderia ocorrer ao lado das nossas casas e com alguém nosso conhecido, a violência não seria maior, apenas seria sentida de mais perto e - talvez- estivéssemos mais alertados para a sua existência.
Vem de trás o não pensar. Os adultos, antigos jovens que multiplicaram crimes violentos sobre jovens, casapianos ou outros, não terão pensado? E o nosso lento sistema judicial pensa tanto tanto que emperra, não em todos os casos, mas em muitos, pelo peso da burocracia e sabe lá por mais o quê, se calhar porque não se pensa em agir de outro modo.
Ou a sociedade avança a um ritmo maior do que a humanidade ou alguém continua a não pensar como se anda a criar a nossa actual sociedade.

Há uns dias na rua, perto de um Multibanco, dois jovens ameaçaram uma amiga e roubaram-lhe o telemóvel, são jovens, não pensaram? Acreditem que me fizeram pensar e muito.
Recuemos dois meses, os assaltos não param e têm formas sofisticadas, um meu vizinho entra no meu sistema Wireless e abusa alegremente durante dois meses do meu sistema, apenas o tempo de eu perceber que há quem não se incomode por usar redes alheias. Será por ser um jovem... que não pensou? Nem comento...
Felizmente inúmeros jovens são pessoas maravilhosas, convém não generalizar, nem no mau, nem no bom. Porém, admitamos que o tentar extorquir o mais possível a outrem seja algo que se banalizou.
Recuemos... há um ano o carpinteiro que contratei não era jovem e desapareceu sem realizar o trabalho pelo qual fora pago era velho não pensou? Nem comento...
O pior é que dentro e fora de Portugal há histórias bombásticas e histórias de todos os dias que são desconhecidas, no que têm de bom e de mau. Se as bombas não param, se a liberdade de expressão continua pelas horas da amargura e pior se a manipulação de informação e a não informação continua a proliferar neste nosso canto à beira-mar plantado como vão agir os que não pensam e como modificarão o pensamento os que têm que repensar?

Afinal quem não pensa é quem continua a acreditar que pode confiar nos outros, quem está no sítio errado no momento errado, apenas porque estão lá outras pessoas que não pensam... Não é por nada mas o que andei a ler deu-me que pensar, embora eu hoje apenas gostasse de me sentir melhor, ouvir o som da chuva e não pensar...

 

Após uma semana atribulada, dominada pelo cansaço extremo, eis que a dor de cabeça acalmou um pouco.
Os sintomas não desapareceram e a crise não está debelada, o cansaço é muito concreto e limitador.
No entanto, sinto-me incomparavelmente melhor, deve ser por estar na lista de espera para conseguir uma consulta na minha médica de família, talvez no próximo dia 13 de Março (não estou a ser irónica... somente o necessário... sei que há muito boa gente que nem médica de família tem, para não falar em família), ou, então, é porque senti a presença de amigos e família que me deram força.
Ás vezes, para irmos mais além, necessitamos somente de um pouco de força positiva e se a perdermos temos de procurá-la onde for necessário
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quinta-feira, fevereiro 23, 2006 

Devido a violenta crise de vesícula, das piores dos últimos anos, o blog fugiu-me definitivamente das mãos. Pede-se a quem o apanhar que o deixe fugir, ele anda meio marado.
Desta vez, acompanhada de perto pela vesícula, vejo-me e desejo-me com a cabeça a latejar, quando consigo arrasto-me pela casa, tipo alma penada. Mal abro o computador para logo o fechar, o barulho das luzes incomoda-me.
Os gatos olham para mim com ar algo receoso. Como isso tem acontecido com frequência fui levada a questionar-me se os pratos deles estariam devidamente cheios. Estão nos conformes ao vê-los penso: será que se comesse apenas destas latas e destes friskies (nome pelo qual designo todo tipo de granulado) ficaria melhor?
Questão puxa questão e penso: terá aquela lasanha, feita com tanto esmero, queijo e molho bechamel tido uma gota de gordura a mais? E aqueles maravilhosos ovos, acompanhados com linguiça from Alentejo trazida pela mãe? Se calhar espalhei-me na manteiga das torradas nos últimos dias... seria demasiada?
Não sei, mas há três dias e duas noites que me arrasto pela casa e não aguento mais...
O meu cartão da adse expirou, ou melhor, foi abatido a tiro pela ministra da educação e ignorado pela DGHAE, após 8 anos de trocas e baldrocas.
Chás, comprimidos, amigos de outras crises, líquidos... nada está a resultar e a dor de cabeça começa a deitar por terra a esperança de poder algum dia vir a respirar normalmente e andar sem uma mão a segurar a testa, não vá esta despenhar-se.
Resumindo estou que não me aguento e pode?

domingo, fevereiro 19, 2006 

As palavras continuam a ecoar algures num espaço da memória e apetece escrevê-las.
Talvez a escrita dos últimos dias se trate de um efeito de déjà vu um pouco insuportável.
Hoje é já quase amanhã, a chuva lavou a estrada, apagou as marcas dos passos e dos percursos realizados, fazendo os sucessos e os fracassos parecerem fantasmas de pássaros que levantaram voo dos beirais.
Há na tentativa de juntar palavras um grito retraído. Não é a azáfama das mãos que o dispersa, não é o corpo que o derrama. Será o silêncio que o esconde.
Parece existir no reencontro de sons uma substância vagamente familiar. Ela permanece na impossibilidade de contar toda a história, porque se reconhece um trajecto e se trilham novos caminhos.
O conhecimento aparece contido num tear de possibilidades, acorda-se e volta-se a dormir dias a fio... porque a saída guarda uma incógnita que adia decisões e faz tremer de frio a alma.
Todo o trabalho de casa foi feito pelas (e nas) pontas dos dedos. Estas despedem-se, agora, nuas e sem calosidades, só porque longe estão os tempos em que a mão esquerda martirizava o braço de uma guitarra, enquanto a direita se ocupava a dedilhar as confusas cordas.
Afinal a garganta que persistia em deixar sair o redemoinho de palavras é a mesma que hoje sussurrou as palavras de ontem e teima em guardar um silêncio magoado.

sábado, fevereiro 18, 2006 

Acordar não é de dentro.
Acordar é ter saída

João Cabral de Melo Neto, citado por Mia Couto

 

Disseram-me há pouco tempo que não há nada que seja eterno e que isso não era forçosamente uma tragédia.
O gato laranja às riscas está novamente em cima dos mapas, a responsabilidade não é do gato nem dos mapas que continuam em cima do estirador e isso não é nenhuma tragédia. Talvez apareça um novo vinco no mapa ou desapareça um traço no papel duro e rugoso. Fui espreitar o mapa e sorri para o gato. O gato miou contente com a minha presença e verifiquei que o complexo ofiótico é uma legenda feita com traços e cores já pouco vivas.
Estou de novo na secretária do lado, que por sinal é uma (pouco) antiga mesa de cozinha, e tal não se deve ao meu gosto pela culinária. No fabrico de objectos assenta o pressuposto de estes cumprirem determinadas funções e de se adequarem a locais específicos. Incrível e fantástico como não há pré-determinismo que impeça um outro uso ou fim para a minha mesa de cozinha que agora tem funções de secretária.
O gato já se mexeu várias vezes, aproximando-se para olhar para mim, afastando-se para o conforto do papel amachucado.
Passa das 14 horas, o dia está longe do fim. No que calo há um fim, excepto no cansaço que aumentou. Resta-me o pensamento de que amanhã pode vir a ser um dia muito melhor.

quinta-feira, fevereiro 16, 2006 


Este postal é das coisas mais bonitas que tenho.
Vai ficar aqui a fazer companhia até eu conseguir regressar com um pouco de bom humor...

terça-feira, fevereiro 14, 2006 

Pensamento do dia:

Sinto muito, não consigo pensar!

domingo, fevereiro 12, 2006 

Tudo bem?

As minhas mãos persistem em teclar, pela noite fora, sem hora marcada para parar.
Agora que comecei a escrever-te as palavras atropelam-se, desejosas de saírem do anonimato que as resguardava. Sinto que lhes devo o benefício da dúvida, quero que façam o seu percurso e voem, embora me questione se chegarão até ti.
Porquê este querer, talvez te perguntes? Porque a timidez é um direito de que me custa abdicar, no entanto, a escrita desvenda também o que permitirmos e tem como anseio ser partilhada, para poder fazer sentido e jus à sua existência. Acrescento ainda: todos existimos pelas nossas palavras e formas de comunicar. Escrever é uma forma de existir.
Escrever-te é um gesto difícil, deparo-me com a mesma familiar tremenda dificuldade: fazer com que alguém, num texto, distinga o que é essencial do que é acessório.
Reconheço que o Tempo passou e estas palavras saíram das minhas mãos tardiamente, deve ser por ser noite, serão talvez lidas como acessórias e não essenciais.
Sei que não há momentos certos, há momentos que resultam, inexplicavelmente, e, há outros que definham por tardios, não sintonizados ou porque simplesmente não resultam.
A vida, dizes-me tu, não é um texto. É verdade, não nego, mas tem muitos pretextos. Fazemos leituras na vida e nos textos, mas na vida não podemos mandar reimprimir e rectificar um fragmento já vivido e que queiramos alterar; acredito, sim ser possível descansar de cansaços antigos e partir para novas paragens, vivendo, já agora, intensamente.
Queria dormir mas falta-me o sono. Não sei se escrever-te contribuirá para reduzir ou para aumentar a distância entre a cama e eu, entre tu e eu. É noite e não dormi, mas tenho a sensação de ter acordado de um sonho, onde a inércia me imobilizava.
Sabes, temo ter consentido numa linguagem de silêncio que ignorou o momento de ranger os dentes, fazer uma careta macaca...gritar, sorrir e lutar pelo que era essencial, com o supérfluo ao lado.
O essencial foste tu e o supérfluo fui eu? Prefiro acreditar que o fundamental somos nós.
És parte do meu universo mais precioso. Mas sinto um cansaço tão grande perante a ausência ensurdecedora que se tem instalado entre nós!
Não sei qual foi o momento em que escolhi não subir aquele lance de escadas apertado, com ar pouco seguro, que via à minha frente e onde sabia encontrar-te. Ironicamente nem tenho medo de alturas, embora possa ter vertigens.
Do cimo das escadas a paisagem é magnífica, o olhar abarca o horizonte e talvez fosse um bom local para lançar velhos fantasmas na aragem da manhã, no fumo de um cigarro, no vazio de um copo, no toque de duas mão, num beijo...
Os tempos eram outros, acreditava no que acreditavas. Tu ansiavas por uma presença, eu pelo tudo.
Não é possível aceder ao que não existiu. É verdade, nos tempos que correm, não basta desvendar sentimentos, interessa muito mais vivê-los intensamente.

sábado, fevereiro 11, 2006 

Olá,

como estás? Bem espero.
Ainda pensas que estamos todos ligados numa foto gigante que se move ao ritmo dos corações, funcionando como Internet universal (sem fios, claro) e sem tráfego delimitado?
Como é o teu mundo, como está a tua vida, quem és tu actualmente... e já agora o que sou para ti?
Vim dizer-te da importância que tens para mim: incomensurável.
Sabes porque me é a tua presença tão preciosa e porque gosto tanto de ti? É por intuir uma sensibilidade que me comove, uma inteligência que se move num mundo de interrogações, numa natureza humana que sabe desvelar-se, ser altruísta, mostrar ironia, ser, por vezes, contagiante de riso, ou, muitas vezes, triste. É por não seres nem uma pessoa perfeita, nem uma pessoa mais ou menos. E é porque da comunicação nasceu uma amizade fantástica e ela é uma forma de amor eterna.
E sabes...mesmo que não o sintas assim neste momento há falta de comunicação entre nós e essa ausência é um bicho estranho, tão insuportável quanto uma presença pode sê-lo.
Já libertei a mente, dei corda aos sapatos, corri sem olhar para trás, sublimei o corpo, ouvi muita música, dancei e abri vinte vezes o frigorífico, sem retirar nada que me satisfaça.
O meu relógio interno troca as horas, que custam a passar, numa espera que ignora a acalmia que se seguiu à tempestade no mar. As gaivotas continuam em terra.
Lembro-me de uma forma de viver que funcionava fora do ritmo das marés, reagia facilmente aos sons e significados guardados nas palavras, aos sorrisos, à vida que escorria numa dentada roubada, num assombro mavioso que exercitava a arte da fuga.
Sabes... o meu teclado fraqueja, hoje choro porque já não acredito que as pessoas bonitas chorem muito.

quarta-feira, fevereiro 08, 2006 

Verídico:
Apanhei o metro, estava pouca gente àquela hora. Entrou um senhor, vestia-se com esmero, camisa, gravata, fato impecável. Tudo com muito bom gosto e de boa qualidade, mesmo muito boa. Lá fora chovia, por isso, talvez, o senhor tinha uma gabardina vestida, por cima do fato. A dita cuja tinha um cinto.
O senhor virou-se, ficando de frente para a saída. E eu contorci-me de riso: No cinto da gabardina... estava pendurado um cabide.
Moralidade da história: homem prevenido vale por dois, nunca se sabe quando um cabide pode ser útil!

sexta-feira, fevereiro 03, 2006 

Se hoje pudesse navegar no Tempo, estaria longe, certamente num dos momentos mais felizes da minha vida, com o céu como horizonte, o mar a convidar-me e, sobretudo, com as palavras e a presença amiga de quem me ensinou a nadar sem medo por perto.
Se pensar bem, tudo continua a existir, numa outra forma, com as devidas alterações nas paisagens física e humana e há amores que duram enquanto vivermos e serão eternos. Não é a ausência do amor que me dói hoje, é a ausência da presença. Não seremos seres físicos? Sem o toque, sem o olhar, sem a voz, sem o cheiro, sem recorrermos aos sentidos o corpo subsiste mas ressente-se. Sim o cérebro controla, a memória armazena e permite refazer junções. Se a saudade fosse exclusivamente portuguesa, quantos portugueses existiriam? Não é a nacionalidade que determina o que sentimos, será vida nas suas passagem, construção e desconstrução.
Mas a memória é um bicho selectivo e voraz e os seres humanos não são perenes: são frágeis. São-no pela sua condição humana, pela determinação que os pequenos detalhes aceites ao longo dos anos lhes proporciona. E é com espanto que se acolhem as grandes notícias, na ignorância das incessantes contribuições que permitem o eclodir de um coração.
Vou continuar a navegar no Tempo, para o que se aproxima a passos largos. Que horizonte, que mar, que presenças/ausências amigas lá estarão? As que a vida proporcionar e as que a memória guardar. Claro que nós damos uns empurrões à vida e de certa forma tentamos conduzi-la, mesmo se muitos factores são difíceis de alterar. Na minha memória hoje está o mar, muitas flores... e está o carinho do meu pai.